O botulismo intestinal é uma doença bacteriana grave e não contagiosa, que resulta da ingestão de esporos ambientais ou de origem alimentar. A condição é geralmente causada pela bactéria Clostridium botulinum, que é germinada em culturas neurotoxicogênicas botulínicas ativas no intestino. Para compreender quais fatores do hospedeiro contribuem para o resultado clínico, recentemente pesquisadores da Universidade de Helsinque, na Finlândia, apresentaram novos insights sobre os fatores ecológicos microbianos que podem desencadear a doença, potencialmente fatal em bebês pequenos.
A partir da análise de um estudo de caso, os pesquisadores caracterizaram a microbiota fecal usando a técnica de sequenciamento Amplicon do gene 16S rRNA ao longo do curso da doença e da recuperação. O objetivo era entender melhor a ecologia microbiana por trás da colonização neurotoxinogênica botulínica excepcionalmente duradoura. Para isso, os pesquisadores analisaram 10 amostras fecais coletadas durante um período de sete meses de um caso de botulismo infantil na Finlândia.
A primeira amostra de fezes (idade infantil de 122 dias) referia-se a um estágio clínico em que o bebê apresentava sintomas graves de botulismo. Entretanto, na última (idade infantil de 380 dias) o bebê já estava recuperado clinicamente. A recuperação foi comprovada por teste negativo para neurotoxina botulínica nas fezes, células vegetativas e esporos de C. botulinum, e alta hospitalar por mais de 200 dias.
De acordo com os cientistas, a composição geral da microbiota fecal infantil e a diversidade dentro da amostra oscilaram ao longo do tempo, indicando grandes mudanças durante e após o curso da doença. “Enquanto as composições gerais foram semelhantes nas amostras coletadas quando o bebê era sintomático e tratado no hospital (102-154 dias), a diversidade da microbiota (riqueza observada, índices de Shannon e Simpson inverso) foram significativamente menores durante a fase hospitalar”, descrevem.
Isso pode ser explicado, pelo menos em parte, pelos tratamentos precoces com antibióticos, pela cessação da ingestão oral de alimentos e/ou por uma carga microbiana ambiental mais controlada durante a fase hospitalar. “Entretanto, devido à ausência de amostras anteriores à internação hospitalar, não fica claro até que ponto esses fatores impactaram a microbiota intestinal infantil”, avaliam.
Composição
Em relação à amostra fecal 2 (143 dias de idade), a composição da microbiota fecal infantil revelou que o filo Actinobacteria, como a Bifidobacteriaceae e Eggerthellaceae, tinha maior abundância em todas as amostras. Já no nível da ordem, Bacteroidales, Bifidobacteriales, Clostridiales, Coriobacteriales, Enterobacteriales, Lachnospirales, Lactobacillales, Oscillospirales e Peptostreptococcales foram detectadas em todos os momentos, enquanto outras famílias estavam presentes de forma intermitente.
“Observamos a abundância relativa de diferentes famílias ao longo do tempo e comparamos com bebês com desenvolvimento normal da microbiota intestinal”, observam os autores. Portanto, embora a abundância relativa de Bifidobacteriaceae em bebês saudáveis geralmente diminua para 10%-20% no final do primeiro ano de vida, tais bactérias permaneceram em um nível alto no paciente com botulismo infantil. Como conclusão, o trabalho fornece informações valiosas sobre as alterações da microbiota que ocorrem durante e após a colonização por C. botulinum no intestino infantil.
De acordo com os autores, é provável que outras assinaturas da composição da microbiota fecal infantil também estejam associadas ao botulismo infantil. “Por esse motivo, defendemos a necessidade de análises futuras mais amplas e sistemáticas que poderão contribuir para desenvolver estratégias e medidas profiláticas para prevenir esta doença bacteriana grave em crianças pequenas”, finalizam. O artigo ‘Case report: Aberrant fecal microbiota composition of an infant diagnosed with prolonged intestinal botulism’ foi publicado, em abril de 2024, na revista BMC.