Fator psíquico influencia o biológico

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Transtorno de somatização é estimulado pelas emoções

Escrito por: Fernanda Ortiz

Estimativas da Organização Mundial da Saúde (OMS) apontam que cerca de 50% das pessoas que procuram atendimento médico não apresentam uma doença física presente na Classificação Internacional de Doenças (CID). Isso significa que essa parte da população está sofrendo de um transtorno de somatização. Resultado de uma condição psiquiátrica que se manifesta como uma desordem física no corpo, este tipo de transtorno é um fenômeno contemporâneo habitualmente originado ou agravado por processos emocionais. Só no Brasil, estima-se que 60% da população sofra de algum grau de transtorno de somatização. Nestes pacientes, o fator psíquico influencia o biológico, enquanto o sofrimento físico afeta a mente.

Segundo a médica psiquiatra Danielle H. Admoni, supervisora de Residência da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (EPM/Unifesp), no transtorno de somatização há um desequilíbrio importante entre corpo e mente. “No somatizador, os sintomas físicos crônicos são acompanhados por níveis significativos e desproporcionais de angústia, preocupação e, até mesmo, dificuldade em desempenhar funções diárias”, observa. Exemplo disso são os crescentes casos de pessoas com queixas de dores, mal-estar e sintomas persistentes, cujos exames clínicos não apresentam causas orgânicas. Portanto, isso indica que, possivelmente, sejam comorbidades de origem emocional.

Um dos responsáveis pelo processo da somatização é o cortisol, um hormônio neurotransmissor que, em níveis equilibrados, exerce funções orgânicas importantes. O cortisol é responsável, por exemplo, por regular o metabolismo, o sistema cardiovascular, a imunidade, o humor e a resistência à dor. Entretanto, quando um indivíduo está sob forte estresse ou ansiedade, o cérebro entende que se trata de uma situação de alerta ou perigo. Com isso, ocorre uma hiperestimulação de produção do cortisol no organismo. “Como resposta, o indivíduo fica mais vulnerável emocionalmente e suscetível a doenças e sintomas somáticos, que podem incluir de dores de cabeça a palpitações”, comenta a médica endocrinologista Claudia Chang, membro da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM).

Gatilhos da somatização

Inúmeras situações podem despertar os sintomas de somatização. Entre elas, as especialistas citam a pressão no trabalho, atividades acumuladas, rompimento amoroso ou pessoal abrupto, perda de um ente querido e problemas financeiros, entre outros. Portanto, são situações típicas e, muitas vezes, rotineiras, que podem levar o indivíduo a uma condição de estresse, ansiedade e tristeza tão grave que, inevitavelmente, atinja um desequilíbrio emocional e orgânico. As crianças também são suscetíveis à somatização, pois, nessa primeira fase da vida, é comum que as emoções sejam manifestadas fisicamente.  Neste caso, cabe aos pais observarem o comportamento dos filhos e identificar se há algo de errado.

Cuidado multidisciplinar

A ausência de tratamento pode gerar um ciclo vicioso em que o fator psíquico influencia o biológico, ou seja, a mente afeta o corpo e vice-versa. A psicóloga clínica Monica Machado explica que a terapêutica voltada à somatização é multidisciplinar, envolvendo a participação de médicos, psicólogos e psiquiatras. “O objetivo é ajudar o paciente a entender a relação entre seus sintomas físicos e sua saúde mental, assim como desenvolver mecanismos de enfrentamento para lidar com o estresse e as emoções negativas”, descreve.

O tratamento, com a realização de exames físicos, laboratoriais e de imagem, é importante para descartar qualquer condição médica subjacente que possa estar causando os sintomas. Na área da Psicologia, através da terapia cognitivo-comportamental (TCC), o paciente é desafiado a entender a relação entre seus sintomas físicos e sua saúde mental. Em alguns casos, o acompanhamento psiquiátrico, com a inclusão de medicamentos antidepressivos e ansiolíticos, pode ser necessário. “Cuidar da saúde mental é fundamental para o autoconhecimento e para entender os alertas que o corpo emite. Em momentos conturbados, estes sinais aparecem constantemente e nunca devem ser negligenciados”, finaliza a psiquiátrica Danielle H. Admoni.

Atenção aos sintomas

De acordo com as diretrizes diagnósticas do CID, o paciente precisa apresentar mais de três sintomas de sistemas orgânicos diferentes, por mais de dois anos, para ser considerado somatizador.

  • Sintomas dolorosos: dor articular, de cabeça ou nas costas
  • Sintomas gastrointestinais: náusea, diarreia ou vômito
  • Sintomas cardiorrespiratórios: falta de ar, palpitação ou aperto no peito
  • Sintomas neurológicos: lapsos de memória, visão embaçada/turva ou dificuldade de raciocínio
  • Sintomas sexuais/reprodutivos: baixa libido, dores na relação sexual ou alterações no ciclo menstrual

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