A microbiota intestinal exerce funções protetoras, metabólicas e estruturais e, por meio de inúmeros estudos, novas fronteiras têm sido descobertas. Evidências recentes também revelam a influência em outros órgãos, como o sistema nervoso central e os sistemas cardiovascular, endócrino-metabólico e digestivo.
Dentro desse contexto, surge a necessidade de aprofundar a função do intestino como órgão de junção no qual certas bactérias podem ser muito benéficas para a saúde. E parte dessas pesquisas busca entender de que forma esse ecossistema pode ajudar na prevenção e no tratamento de doenças específicas das mulheres.
De acordo com pesquisadores italianos que desenvolveram um artigo sobre o tema, a microbiota intestinal é única e dinâmica ao mesmo tempo. Dessa forma, está sujeita a fatores externos que podem alterá-la, e é capaz de se modular nas diferentes fases da vida da mulher. Portanto, a microbiota desempenha um papel importante que surge do entrelaçamento de mecanismos biológicos entre o ambiente intestinal e o sistema genital feminino. “A microbiota intestinal pode desempenhar um papel fundamental na medicina personalizada”, pontuam.
Nas mulheres durante a puberdade, os estrogênios são importantes para diferenciar a microbiota com características promotoras de saúde. Já a gravidez representa o período que exemplifica mais claramente as relações existentes entre a microbiota e os níveis hormonais.
“Nesta fase, a modificação das bactérias intestinais produz alterações relevantes e evidentes que vão desde uma condição inflamatória de baixo grau, típica do estado de gravidez, até uma tolerância reduzida à glicose”, detalham. Em mulheres na menopausa já foi observada uma depleção de Firmicutes (ou Bacillota) e uma reorganização progressiva do microbioma intestinal.
Diferenças
Alguns fatores podem influenciar a composição e o equilíbrio da microbiota intestinal na idade adulta. Dentre os exemplos estão condições ambientais, níveis de estresse, predisposição genética, estrutura hormonal, terapias farmacológicas, hábitos alimentares e estilos de vida. De acordo com os pesquisadores, existem diferenças entre a microbiota intestinal masculina e feminina que possuem relação com a diferenças hormonais, autoimunes, étnicas ou puramente fisiológicas, como índice de massa corporal e idade.
“Os microrganismos da mesma espécie podem produzir metabólitos diferentes dependendo do gênero do hospedeiro e interagir de forma diferente com hormônios sexuais, produzindo efeitos diferentes”, descrevem. Essas diferenças aparecem após a puberdade, sugerindo que os hormônios sexuais têm um papel fundamental na influência da composição da microbiota intestinal. Entretanto, o microbioma se desenvolve progressivamente junto com a maturação do sistema imunológico e nervoso ao longo da vida em homens e mulheres.
Meninos e meninas, durante a infância, também mostram diferenças significativas na quantidade de filos Actinobacteria (Actinomycetota), Firmicutes e Bacteroidetes, com maior proporção Bacteroidetes/Firmicutes em meninos em comparação com as meninas. Na população adulta, homens e mulheres mantêm diferentes quantidades de filos da microbiota intestinal, a exemplo de Firmicutes, Verrucomicrobia, Bacteroidetes, Fusobacteria e Actinobacteria.
Microbiota da mãe e do filho
Existe uma troca complexa e controlada de bactérias e outros microrganismos de mãe para filho, mesmo antes do nascimento, que prepara o sistema imunitário do recém-nascido para enfrentar o mundo exterior. Ao nascer, o trato digestório do recém-nascido é estéril, mas é colonizado imediatamente desde o nascimento pelos microrganismos com os quais entra em contato. Assim, cada indivíduo adquire uma microbiota intestinal pessoal.
Essa microbiota exerce funções protetoras porque será parte integrante dos mecanismos de defesa com um conjunto extremamente heterogêneo de bactérias, protozoários, fungos e vírus que formam a barreira entre o ambiente externo e o interno. “Uma microbiota com elevada diversidade pode manter certas funções e é geralmente uma garantia de um sistema imunitário saudável”, afirmam os pesquisadores. Em contrapartida, uma microbiota de baixa diversidade pode sofrer deficiências mais facilmente e causar problemas nas defesas imunitárias.
“A microbiota intestinal de recém-nascidos de cesariana e/ou amamentados artificialmente parece ser profundamente diferente e leva mais tempo para se estabilizar”, afirmam. Entre os 4 e 36 meses de vida, como resultado do contato com os pais, o ambiente externo e os alimentos, a microbiota intestinal desenvolve-se e muda rapidamente. O artigo ‘Gut microbiota in women: The secret of psychological and physical well-being’ foi publicado em 2023 no World Journal of Gastroenterology.